Discriminação continua a ser um tabu social

Com receio de sofrer ainda mais descriminação, João Fernandes (nome fictício) prefere manter o anonimato. O seropositivo sofre no meio familiar e social, desde que a mulher morreu, vítima de VIH/Sida. Entre as consequências, lamenta, a perda da guarda dos três filhos, actualmente sob a tutela dos parentes da falecida esposa.

“Chamam-me de assassino e bruxo”, conta. Com 37 anos, descobriu que era seropositivo. Ainda lembra do dia. 10 de Dezembro de 2014. “Um dia tive uma violenta briga com a esposa e fui viver com um amigo, por seis meses. Nesta altura, devido às más influências, comecei a sair com várias mulheres. Chegava ao ponto de me envolver sexualmente com duas mulheres diferentes, no mesmo dia, e sem protecção. Passei a beber muito. Era uma vida sem limites”, recordou.

Questionado sobre como contraiu a doença, disse que não sabe, assim como não imagina quem o contaminou. “Na altura pensava que a doença fosse uma invenção. Mas, um dia, comecei a passar mal. Tive febre, muita tosse e uma indisposição estranha. Fui ao hospital e o diagnostico era de paludismo. Fiz a medicação, os sintomas passaram e voltei à vida normal. Depois de um mês, voltei a passar mal. Fui levado por colegas, num estado crítico ao hospital. Após os exames preliminares disseram ser pneumonia e febre tifóide. Fiquei internado, sem nenhum familiar por perto. Então, pediu à esposa, de quem estava separado a seis meses, para, em nome dos filhos, me prestar atenção”.

Como o casal ficou mais próximo durante o internamento, ao ter alta médica regressou a casa. Após sete meses, voltou a ter recaída e a médica que o acompanhou durante o primeiro internamento solicitou um exame de VIH, que deu positivo. “Simplesmente não aceitei a doença, eu não podia ter VIH. Era mentira. Sai do hospital e nunca mais voltei lá. Ao chegar a casa, não tive coragem de contar a esposa e vivia como se não tivesse nada”.

Meses depois, em 2017, a esposa ficou grávida e na primeira consulta pré-natal, foi diagnosticado também com VIH. Alarmada com o resultado, repetiu os exames numa outra unidade de saúde. O resultado foi o mesmo.

Diferente do esposo, ela mostrou o resultado ao marido e lhe acusou de a infectar. “Já não consegui esconder. Contei que descobri a doença meses antes de termos reatado a relação, mas não tive coragem de contar”, infelizmente, essa atitude egoísta acabou por a matar. 

Um dia depois de ter recebido o segundo exame, lamentou, a esposa decidiu se enforcar no quarto dos filhos, deixando apenas uma carta onde pedia desculpas à família. “Ela orientou que recebessem os filhos ao esposo”. A mágoa e dor da família dela era tanta, que foi impedido de acompanhar o óbito.

“Sei que falhei muito e por conta disso desestruturei a família. Hoje faria tudo diferente. Por isso, não peço nada. O que fiz é um crime. Não me perdoou. Apenas cumpro com a medicação para estar vivo e com saúde, caso os meus filhos precisem de mim um dia”, explicou. 

POR: J A

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